
Tribunal Constitucional trava nova Lei dos Estrangeiros em Portugal
Lisboa, 8 de agosto de 2025 — O Palácio Ratton, sede do Tribunal Constitucional (TC), foi esta sexta-feira palco de uma decisão com forte peso político e social, lembrando episódios marcantes do tempo de Pedro Passos Coelho. Às 17h00, numa sala cheia de jornalistas, a juíza relatora Joana Fernandes Costa anunciou que cinco das sete normas centrais da nova Lei dos Estrangeiros não passam no crivo da Constituição da República Portuguesa.
A decisão surge menos de um mês depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter enviado o diploma à fiscalização preventiva do TC, pedindo urgência. O texto aprovado na Assembleia da República, com votos favoráveis do PSD, Chega e CDS-PP, pretendia endurecer regras de entrada e permanência de estrangeiros em Portugal, mexendo sobretudo no reagrupamento familiar e no direito de recurso.
O que ficou pelo caminho
Segundo o acórdão, impor um prazo fixo de dois anos para que imigrantes solicitem o reagrupamento familiar viola o artigo 36.º da Constituição, que consagra o direito à unidade familiar. Somar a esse prazo um período de decisão administrativa que poderia chegar a 18 meses — entre nove iniciais mais possível prorrogação — foi considerado igualmente incompatível com os deveres do Estado de proteção à família.
O tribunal também travou normas que restringiam o acesso a tribunais para contestar decisões da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), por entender que limitavam de forma “excessiva” a tutela judicial efetiva.
O presidente do TC, José João Abrantes, sublinhou no final que se trata de uma decisão que “reforça a centralidade dos direitos fundamentais no Estado de Direito português”.
Reações imediatas
Minutos depois da leitura pública, Marcelo Rebelo de Sousa confirmou que vetará o diploma e o devolverá ao Parlamento. “A Constituição está primeiro”, declarou à saída de Belém, sinalizando que qualquer nova versão terá de respeitar integralmente as indicações do Tribunal.
Entre os partidos, o PSD fala em “afinamentos técnicos” para viabilizar a lei, enquanto BE e PCP defendem que o texto deve ser “reformulado de raiz” para salvaguardar direitos dos imigrantes.
Juristas e constitucionalistas veem no acórdão um marco na reafirmação da jurisprudência portuguesa sobre o direito à vida familiar e ao acesso à justiça.
Memória de outros tempos
O momento vivido no Palácio Ratton fez ecoar memórias do período entre 2011 e 2015, quando, sob o governo de Pedro Passos Coelho, o Tribunal Constitucional interveio repetidamente para travar cortes e medidas legislativas de grande impacto. Tal como então, a justiça constitucional voltou a assumir-se como árbitro decisivo num dos debates mais inflamados da agenda política portuguesa.